sábado, 29 de maio de 2010

Ah... eu queria

Queria saber cantar, sem desafinar. Cantar rouco e baixinho, pra encantar o meu amor. Queria ter asas. Pra perder o medo de altura e fazer voar a minha imaginação. Queria saber dançar. Pra acertar sempre que ele me convidar pra um forró. Ver sempre a beleza do mundo. Assistir a todos os filmes que eu tiver vontade. Dizer apenas coisas boas. Ignorar os babacas. Comer todo o chocolate do mundo até a tristeza passar. E comer mais um pouquinho depois, pra comemorar. Guardar apenas as boas lembranças na memória. Queria ser mais prática e manter meus pés no chão. Só os pés, vai... Mas deixar o pensamento ir longe, longe, Londres, Paris. E nunca deixar de sonhar acordada. Beijar pra sempre o mesmo homem. O homem do forró. Queria fechar os olhos e ver a cor do tempo. Nunca perder a fé e a esperança. Fazer planos pra amanhã, e pra daqui cinco anos. Queria que ele acreditasse em mim. Queria aprender algo novo todos os dias. Pra poder ensinar algo novo todos os dias. Queria que dentes desalinhados fossem bonitos, porque aparelho atrapalha tudo: comer, falar, passar fio dental, e ainda brilha na foto. Queria ter a paciência de Jó. Queria engravidar de novo, ver a vida nascer, a barriga crescer, as roupas não caberem mais. Ter desejos e ser paparicada. Queria escrever mais poesias. Queria sentir novamente o cheiro do pão da minha mãe. Queria o colo dela nos momentos de solidão. Queria ter minha loja. Queria levar o meu filho pra Disney. Queria saber ensinar a viver. Educar sem errar. Me preocupar menos. Me preocupar mais. Ter saúde até meus filhos ficarem velhos. Pra ver que pessoas se tornaram e sentir orgulho da mãe que fui. Amar sempre as pessoas como se não houvesse amanhã. Assistir ao Oscar todos os anos com ele. É, ele mesmo: o homem do forró. E passear de mãos dadas na Argentina. Queria ser um pouco mais baixa e ter os pés mais bonitos. Queria saber se estou certa. Queria saber as respostas... "mamãe, o que é inspiração?" Queria ver um sorriso na boca de toda criança. Ver o mundo sem fome, sem violência, dirigir à noite com as janelas abertas. Queria ouvir o "tssss" e tomar uma coca-cola. Bem gelada. Queria que todas as pessoas conhecessem a felicidade. E que dançassem forró com a mesma alegria que eu danço. Queria andar de bicicleta na Europa. Queria ter mais tempo pra dar conta de tudo. Ou pra não fazer nada. Fazer mais trabalhos voluntários, ajudar alguém. Queria casar na Igreja de véu e grinalda, festa e chuva de arroz. Jurar amor eterno àquele homem do forró. Chorar de emoção, rir de soluçar. Queria que toda maquiagem fosse à prova d'água. Queria não pegar engarrafamentos. Ter minha casa, minha família, meu lar. Pra cuidar. Contar as mesmas fábulas todas as noites enquanto eles as ouvem como se fosse a primeira vez. Arrumar do meu jeito, lavar roupa e ver se o dinheiro vai dar. Esperar pra jantar. Queria dividir as contas, pagar escola, empregada, supermercado, e deixar pra daqui uns meses aquela mesa nova que agora está muito cara. Queria ter de novo aquele caleidoscópio que eu tive na infância. Também queria ter uma graninha todos os meses pra gastar só comigo. Queria ganhar flores. Queria saber os nomes das constelações. Acordar todo dia sem o despertador. Tomar café com calma. E com eles. Dizer eu te amo todos os dias. Esperar a chuva passar na varanda. Esquiar. Fazer boneco de neve. Dirigir num rally. Ter um closet. Comemorar mais um aniversário de casamento dançando forró, mesmo estando bem velhinha. Queria saber que o amor é assim. Exatamente assim: trancar as portas e fechar as janelas pra não entrar corrente de ar. Olhar pra eles com ternura antes de me deitar. Esperar que ele veja se não há ninguém embaixo da cama. Dormir de mãos dadas todas as noites. Cantar canções de ninar, mesmo sem saber cantar. Ter coragem pra saltar de pára-quedas. E mesmo assim não saltar, porque o seguro morreu de velho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário